Reflexões sobre o luto

Quando o luto e trauma andam de mãos dadas

Notícias de última hora:

“Acidente em auto-estrada: 3 mortos e um sobrevivente”

“Criança morre por morte súbita”

“Mortes confirmadas em incêndios florestais”

 

Estes são só alguns exemplos de notícias com as quais nos confrontamos no nosso dia-a-dia. Basta ligarmos a televisão ou olharmos de forma atenta à nossa volta para nos depararmos com estas ou outras situações em que o luto e o trauma andam de mãos dadas. Apesar de entidades separadas, encontram-se muitas vezes associadas.

Ora vejamos: em situações de perdas repentinas, violentas, “contra-natura”, as nossas concepções do mundo como algo justo, com uma ordem e previsibilidade, caem por terra. Vivemos muitas vezes na ilusão protetora de que “a nós tal nunca acontecerá”, “tudo nos irá correr bem”, como se fosse inconcebível conseguirmos imaginar uma realidade que ultrapassa por completo o nosso controlo. Esta narrativa não é congruente com um episódio traumático ou uma perda significativa, que se convertem frequentemente em acontecimentos incompreensíveis e inexplicáveis. A nossa sensação de segurança é destruída. Podemos sentir-nos desamparados, vulneráveis, impotentes e sem controlo.

É aqui que entram as manifestações do chamado luto traumático. Para quem o vive, surgem sensações de descrença e atordoamento e as emoções são intensas e imprevisíveis. As imagens traumáticas repetem-se nas suas mentes como se fosse um filme que não se quer ver mas não se consegue evitar. A realidade do acontecimento invade quando menos se espera. Não pede licença. Não há “preparação” possível. Podem igualmente surgir dificuldades de concentração, alterações de sono ou de apetite. De repente, nada faz sentido. A vida é vazia e sem significado. E não nos esqueçamos do sentimento de culpa e dos “e se…?” – “E se eu tivesse dado mais atenção àquela dor de cabeça?”; “E se tivesse saído uns minutos mais cedo?”; “E se eu lá estivesse estado?”. “E porquê a mim? Porquê ela?”. Que frustração não encontrar um sentido no meio do caos, encontrar algo que possa de alguma forma tornar a experiência mais palpável, menos incompreensível.

Estes são só alguns exemplos de manifestações de luto traumático. Perante a intensidade e transversalidade dos mesmos a várias áreas da vida da pessoa, não é de entranhar a convicção de que o trauma dificulta de facto a integração da perda. Mas, se estiver a viver uma experiência com estes contornos, não tem que fazer este caminho sozinho. Procure ajuda especializada, não para recuperar a sua vida (essa vida mudou). Mas sim, para que viva de forma plena e coerente com o que quer para si, com e apesar do acontecimento.