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Como comunicar a notícia da morte

12/08/2014

No início dos workshops coloco sempre à disposição dos participantes um tempo para colocarem questões. Acima de tudo, pretendo saber o que traz as pessoas a participar, nomeadamente as questões que têm, relacionando o tema luto com o desempenho efetivo das suas funções profissionais.

Desde maio que já ministrámos 32 edições em todo o país com mais de 650 participantes. Uma das questões mais frequentes é: "Como comunicar a notícia da morte a alguém?". Dado tratar-se de participantes que, na maior parte, colaboram em casas de repouso, a questão é dirigida à forma de comunicar a notícia da morte às famílias dos utentes que morreram.

Neste sentido, retorno a questão da comunicação às famílias como a abordagem de gerir uma má notícia por parte de quem comunica. Abordagem no sentido da consonância entre o comportamento verbal e não-verbal do comunicador, ou seja, dizer aquilo que se sente.

Quem comunica é o profissional, mas também uma pessoa que é considerada por muitos como "a extensão da família". O profissional que cuida em fim de vida é visto pela família como alguém que pertence "à sua família" pelo carinho e empenho que dedicam diariamente ao utente. Assim, o profissional que comunica a notícia da morte à família, muitas das vezes, pela força da vinculação que ganhou com o falecido, está ele próprio em luto!

Na generalidade, temos uma percepção da reação que os outros vão ter e isso condiciona a forma como comunicamos a notícia da morte. Parece, por exemplo, mais fácil comunicar a notícia da morte à família de um idoso que partiu, mas que viveu em plenitude os seus últimos dias, do que comunicar a um idoso a morte prematura do seu neto. O impacte da morte, a idade, a vinculação, a nossa estrutura de personalidade e gestão do stress, o apoio social... desempenham um forte preditor da forma como vamos receber e gerir a notícia da morte, assim como a forma como a comunicamos.

O profissional poderá ter um papel fundamental na gestão da má notícia e, para tal, deverá entregar-se à família sem reservas. A título de exemplo: deverá receber a família num local reservado, mantendo-se ao nível desta (sentados, olhos nos olhos, adaptar a linguagem, tocar sem medos) e comunicar a notícia evitando (a) mentir sobre a morte (quanto mais tempo demorar a comunicar, maior a tensão interna da família e a do profissional que comunica); (b) criticar o comportamento demonstrado pela família após a notícia (crê-se que quando a família demonstra apatia/não chorar após a notícia, despoleta no profissional a tendência para criticar "Se não chora é porque não gostava do falecido"). Mesmo que o profissional não verbalize, todo o seu corpo (postura e gestos faciais) pode transmitir essas mensagens de crítica; ou se a família entra em choque e chora, o profissional pode assumir uma postura paternalista ou moralista "Não chore, ele/a não ia gostar de o ver assim"), entre outras.

Pretende-se que comuniquemos a notícia com todo o humanismo e dignidade. Nesta perspectiva temos que aceitar as reações da família evitando julgamentos que surgem naturalmente por causa das expetativas que levamos ("Eles vão passar-se..." ou "Nem vão ligar nenhuma, pois raramente visitavam o falecido...").

Não há pois uma "embalagem" de como comunicar a notícia da morte, pois cada pessoa sofre à sua maneira e o luto é um processo individual e exclusivo (embora influenciado pelos valores e cultura onde nos desenvolvemos). Mas também não existe outra forma de dizer "Lamento informá-lo/a do falecimento de X", portanto devemos, após a notícia, estar ao lado da família sem desistir dela, porque o sofrimento da família projeta no profissional reações que, muitas das vezes, são contrárias à atitude profissional exigida ("Quem está de luto é a família... não podemos chorar."), devemos estar atentos às dificuldades expressas e dúvidas sobre o que fazer. Existem um conjunto de técnicas que exploramos ao longo do workshop e um conjunto de "dicas" sobre o comportamento verbal e não-verbal do profissional, mas continuam a ser "embalagens"…

Comunicar significa relacionarmo-nos, empatizarmo-nos, disponibilizarmo-nos!

As más mensagens que enviamos num momento tão único e difícil podem exprimir-se através deste testemunho de um jovem de 17 anos que está a morrer:

"Os meus amigos já não me veem visitar. A minha família quer acreditar que vou sobreviver. Vou morrer sozinho!"